Muita tinta e muita gente
![]() |
Foto: Lucas Matos |
Quem passou em frente Museu Municipal da Arte (MuMa) em Curitiba ficou perplexo com a quantidade de pessoas que faziam fila para entrar. “Deve ser algum daqueles eventos de fantasia”, comentou um transeunte que observava a cena com certa curiosidade. Era quase isso, milhares de pessoas se reuniram no local entre os dias quatro e sete de setembro para conhecer quadrinistas, ilustradores e roteiristas de histórias em quadrinho que foram distribuir autógrafos, ministrar mesas de discussões, oficinas e divulgar seus trabalhos.
A Gibicon acontece pela segunda vez, e já é um dos eventos na área mais importantes do país. Gente de todo Brasil veio expor seu trabalho, além de artistas internacionais como Davi Lloyd, que desenhou o famoso quadrinho V de Vingança, e Kim Jong Gi sul-coreano que desenhou um painel durante todos os dias da convenção.
Andando
pelo museu me surpreendi por não encontrar muita gente fantasiada de seus
personagens favoritos, o que é uma prática comum entre fãs de quadrinhos/mangás
e cultura pop em geral. O cosplay, como
é conhecido o ato de se fantasiar de seu personagem preferido surgiu nos
Estados Unidos em 1939, mas foi no Japão que ele ganhou status e virou febre mundial. Essa talvez seja a maior manifestação
explícita da influência da cultura pop.
Outros
eventos de quadrinhos como a Comic Con atraem
milhares de cosplayers, com realização de concursos específicos para avaliação
da performance do personagem. No Brasil, as primeiras convenções de Star Wars já traziam pessoas fantasiadas
com seus personagens preferidos.
Aqui
o mercado de eventos relacionados aos mangás, quadrinhos e cultura pop cresce
exponencialmente, muitos são especificamente ligados à cultura japonesa de mangás e animes. Isso não quer dizer que não aconteçam convenções para
quadrinhos em geral. Existem três grandes eventos relacionados ao tema: A FIQ –
Festival Internacional de Quadrinhos em Belo Horizonte; A Comic Con Experience em São Paulo; e por fim, a já citada Gibicon
em Curitiba.
Curitiba
teve uma cena muito forte de quadrinhos na década de 70, com a editora Grafipar
que distribuiu quadrinhos para o Brasil todo, e aí surgiu o Gralha, super herói
com história ambientada em Curitiba. Ele recebeu uma homenagem na Gibicon, com
um estande só para ele e edições ouro das HQs, além de action figures dignas da estante de qualquer colecionador
aficionado por quadrinhos alternativos. Aliás, as mesas e estandes de editoras
e quadrinistas alternativos/independentes movimentaram muita gente interessada
em conhecer novas histórias, consumir e conversar diretamente com a pessoa que
participou do processo de criação.
Os
quadrinhos para adultos são os mais procurados, devido à temática madura e
histórias com maior liberdade de criação. E aí para chamar a atenção de quem
estava no espaço reservado para os quadrinhos independentes valia tudo. Tinha
gente desenhando na hora, tinha pessoas vendendo produtos e artigos de
decoração criativos, além da venda de camisetas nerds. Mas aí vale a regra básica do comércio: simpatia vende muito
bem. Me interessei antes pelo que o quadrinista iria me dizer para vender seu
trabalho porque o contato direto com quem produziu é uma das coisas mais legais
de ir em uma convenção de quadrinhos.
Para
um dos curadores do evento, o curitibano Antonio Eder, a cidade vive um momento
de grande produção no cenário nacional. “Hoje
tem 18 lançamentos só curitibanos no Gibicon. É muito mais fácil editar seu
próprio trabalho, mas eu acho que o pessoal tem que empreender”. E o pessoal
empreende muito, a internet serve como um catalisador para produção
independente no país e no mundo, através do crowdfouding
projeto de financiamento onde várias pessoas doam uma quantia de dinheiro
para ver determinado produto pronto. E isso facilita o empreendedorismo
independente, a maioria dos quadrinhos da sessão de vendas foram financiados
graças a essa ferramenta.
Felipe lançou seu segundo quadrinho pelo catarse, ferramenta
de crowdfounding brasileira. “Nunca é
tranquilo pra arrecadar a meta. Tem que postar todo dia, encher o saco do
pessoal. É um trabalho intenso”. E isso que é interessante no catarse, é o
criador do produto promovendo diretamente. Se fica difícil financiar seu
quadrinho sem uma editora, o trabalho árduo pelo financiamento independente
compensa pelo fato de não haver nenhuma limitação criativa feita por terceiros.
Conversando com André Calliman, que também financiou seu
quadrinho “Revolta” pelo catarse, soube que durante o começo da ferramenta no
país o que mais movimentou seguidores e apoiadores dentro da rede social foram
projetos de histórias em quadrinho. Tem muita gente querendo produzir, as
editoras não conseguem mais dar conta. E aí que surgem as editoras
independentes para também auxiliar o artista, como é o caso da editora Nemo. Quem
quer lançar uma HQ deve saber que opções não faltam, também tem como lançar
diretamente na internet através de pdf, só fica mais difícil receber alguma
gratificação monetária dessa forma, e claro, tentar uma editora grande não
precisa ficar de fora dos seus planos.
No meio de tanta gente fica difícil andar de um estande ao
outro. Lá pelas quatro da tarde preferi sentar e olhar o movimento na gibiteca,
a única pública da cidade e que também fica no MuMa. Se alguém ainda tem
dúvidas sobre o crescimento dos quadrinhos para adultos no país talvez esse já
seja um indicador suficiente para mostrar que tem público sim, e também tem
muitos artistas.
0 comentários: